segunda-feira, março 31, 2014

Random #1

A-M-O-T-E, a-mo-te, am-o-te, amot-e.
Enfim,
amo-te de qualquer forma e feitio,
com todas as sílabas e outras
combinações de hífenes
entre as letras desse tempo verbal
do singular pessoal, do íntimo,
do verbo amar.
Et-oma de trás para a frente,
e até de forma estranha.
Entranha, carrega a fundo
na paixão, na aventura
da escuridão do desconhecido
do mistério da esperança.
M-taoe de forma aleatória.
Ao calhas, desordenadamente,
sem pés, mas com cabeça
no ar, nas nuvens,
sem gravidade!
Nas calmas,
sim, amo-te nas calma,
numa boa.
Estou relaxado,
temos tempo.
E agora chove,
não chores, sorri,
chora de alegria.
Dá-lhe com força, no chorar alegre,
que só tu sabes dar e só tu
o fazes com delicada destreza.
Olha que giro:
A
m
o
|
t
e
na vertical até!
Deixa-me olhar-te agora:
És-me linda.
Não,
deixemo-nos de brincadeiras,
de exageros inúteis,
fúteis, voláteis,
pouco plausíveis!
Agora a sério,
arrisco,
enfrento,
encaro.
Ouso o seguinte dizer-te:
Gosto de ti.

Atreves-te?
Eu sim...



sexta-feira, março 28, 2014

Almofada

E quanto tapavas a vergonha do rosto com uma almofada quando eu te dizia que eras linda, lembras-te? Eu lembro! Ficavas uma ternura quando coravas; uma delícia de carinho embrulhado em lençóis com suaves tons de rosa. Voltava a elogiar-te enumeras vezes só para te ver abraçar a almofada ainda com mais força. Às vezes era um peluche qualquer; lembro-me de uma vaquinha simpática que tinhas perdida pela cabeceira da cama. De vez em quando, lá vinha o bovino de tecido fazer tempo de antena diante da câmara do computador. Sempre adorei esse teu lado infantil. Ficavas constrangida e sem jeito. Eras magnífica sem jeito algum! Foi por essa simplicidade inicial que me apaixonei quem nem um parvo entusiasmado. É essa tua candura que ainda guardo numa caixinha de recordação quente. Não está escondida, nem sequer a uma chave trancada. Tem somente à volta um cordão de saudade e sem nó complicado, não vá o seu conteúdo perder-se por infortuna razão. É apenas o que é: uma ponte para um passado feliz que não me arrependo de ter partilhado contigo; não tenho vergonha, não preciso de almofada para me esconder sempre que a ele regresso...


quarta-feira, março 26, 2014

Quote #16

" (...) talvez um dia quem sabe o destino
volte a ter novos contornos e nos olhe de frente
e ainda sobre tempo para reaprender a soletrar correctamente
todas as palavras que admitiam ter nascido
do teu corpo da tua voz do sabor da tua boca
tempo para povoar de novos sons os velhos discos de vinil
e sonhar com mundos à espera de serem salvos
pelas nossas palavras

tempo para nos olharmos e encontrarmos
sem remorsos
a maneira de nos perdermos de novo nos caminhos
que levam ao coração absoluto da terra

talvez um dia quem sabe eu volte
a faltar às aulas para esperar por ti. "

(Alice Vieira)

terça-feira, março 25, 2014

Dúvidas

Perguntei-me por ti, mas não te encontrei. Perdi-te algures dentro do corpo que partilhei contigo, esse mesmo que foi teu também durante o silêncio de dois olhares apaixonados. Dois? Ou apenas o meu? Fica a dúvida, também ela perdida no mistério desse algo subtil que nos uniu por breves instantes. Sim, breves, mas intensos, pequenas detonações de amor virgem, inexperiente, novato e pouco consciente da força da ilusão que imita a realidade quase na perfeição sorrateira. Estiveste realmente comigo nesses momentos de partilha em que me ofereci de olhos fechados? Fica a dúvida para posterior reflexão!

Não resta dúvida, porém, naquilo que te digo agora: amei-te com os sentimentos senis do louco em que, num ápice, me transformei quando te conheci; E tu? Tu amaste-me somente com o teu olhar cônscio e de literal modo, num piscar olhos, deixaste escapar o prematuro sentimento que juntos semeámos à pressa, adubado com beijos de sonhos, nesses tais momentos de volátil ternura.

E agora, que mais?

Fica a dúvida de um futuro imperfeito que deambula no pretérito condicional às palavras que segredámos um ao outro. Mas do que valem as palavras se não sucedidas por acções que lhe façam jus? De que valem as promessas incumpridas, abandonadas ao Deus-dará?

Estas são, assim, as minhas questões, as minhas dúvidas, eu sei lá...



sábado, março 22, 2014

Abraço

Quando me voltares a ver,
Não te esqueças de me abraçar.
Quando me voltares a abraçar,
Não te esqueças de me dizer
Ao ouvido, baixinho,
Em jeito de segredinho,
Que estás feliz e contente,
Por nos teus braços,
Me voltares a ter.
E não te esqueças do seguinte:
Nos braços de alguém,
Não é comum eu me encontrar,
Por isso aproveita bem
Quando não me podes ter,
Mas tens!

sexta-feira, março 21, 2014

Lugar

Se ainda quiseres, vem também,
onde estou, para onde irei,
conheces o local, conheces o projecto,
as promessas e os desejos
enrolados debaixo das línguas,
como palavras que não se dizem,
mas que se beijam
e se soletram, lentamente,
com os lábios
húmidos de teimosia.

Partilhámos a mesma visão, 
Já construímos parte do caminho
que agora percorro, sozinho...

Ainda há espaço para ti:
Não te guardo o lugar,
Ele é teu,
Ele és tu,
A eterna ausência de ti...

quinta-feira, março 20, 2014

Quote #15

" A lembrança dos teus beijos
 Inda na minh’alma existe,
 Como um perfume perdido,
 Nas folhas dum livro triste.

 Perfume tão esquisito
 E de tal suavidade,
 Que mesmo desaparecido
 Revive numa saudade! "

 (Florbela Espanca)

quarta-feira, março 19, 2014

Balanço

Se amas,
porque te afastas?
Quererás tu a apanhar balanço,
para te atirares em forma de abraço cego?

Afasta-te então,
e atira-te a mim por fim!


Esperar

O que se espera,
quando não há nada
por que esperar?

Onde fica a esperança,
perante a ausência
do objecto esperado?

Fica à espera!
Porque até a esperança
espera que o nada se
torne em coisa alguma:

A ausência em presença,
A saudade num abraço,
Um desejo num beijo
Um sonho numa vida,
Um pensamento em palavras ditas,
e outras tantas escutadas.
Uma imagem num olhar a dois,
intenso, despreocupado, íntimo!
Uma memória numa troca
volátil de perfumes escondidos
debaixo das peles nuas.
A solidão,
essa companheira minha,
em ti, em ti...

quinta-feira, março 13, 2014

Quote #14

" Agora que o silêncio é um mar sem ondas,
 E que nele posso navegar sem rumo,
 Não respondas
 Às urgentes perguntas
 Que te fiz.
 Deixa-me ser feliz
 Assim,
 Já tão longe de ti como de mim.
 Perde-se a vida a desejá-la tanto.
 Só soubemos sofrer, enquanto
 O nosso amor durou.
 Mas o tempo passou,
 Há calmaria…
 Não perturbes a paz que me foi dada.
 Ouvir de novo a tua voz seria
 Matar a sede com água salgada. "

 (Miguel Torga)

terça-feira, março 11, 2014

Até lá

Não basta amar e sermos amados. Isso, por si só, não chega. É preciso fazê-lo no tempo correcto, é preciso ter essa sorte, essa coincidência feliz que o acaso proporciona de forma criteriosa. Amei-te no momento incorrecto, mas amei-te de verdade. Amar incorrectamente no tempo não significa amar menos, mas antes não ter condições para continuar a amar dessa forma. Quando esta exigência temporal se impõe, não vale a pena insistir mais. Quando assim for - quando assim tiver que ser - há que ter a coragem para largar tudo. Quiçá esse amor se possa conservar dormentemente numa semente de lótus, para um dia, quem sabe, rebentar num tempo que seja o seu e nele possa florir com toda a merecida pujança. Quiçá nos possamos encontrar nesse futuro ou universo paralelo - Até lá! -  se assim tiver que ser...

domingo, março 09, 2014

Até já

- Então como é que correu?
- Olha correu bem...disse-lhe o que pensava e o que sentia; disse-lhe que vinha em paz e amor; disse-lhe ainda que era bom demais para ela e que ela tinha ainda muito que crescer e aprender, tal como eu cresci e aprendi com ela. Pediu-me desculpa, mas não ouvi bem dessa primeira vez. Pedi que repetisse, mas olhando-me nos olhos profundos de modo a ouvi-la melhor - Desculpa! - repetiu; tinha os olhos rosados e cristalinos, como quem tem vontade de chorar; o seu olhar estava pesado e o corpo com pressa de ir embora, nervoso. Fitava-me com dificuldade; tive pena dela. Perguntei-lhe se o problema estava em mim; respondeu-me com negação afirmante. Depois, se eu lhe era indiferente - Queres que te seja mesmo sincera? Sim, acho que sim! -  foi a sua resposta sincera quase na ponta da língua imediata, como se já tivesse treinado a reposta. No final, em jeito de amizade e compaixão, dei-lhe um abraço e disse-lhe para ser feliz...


quinta-feira, março 06, 2014

Quote #13

" Porque a minha vontade tem o tamanho de uma lei da terra. Porque a minha força determina a passagem do tempo. Eu quero. Eu sou capaz de lançar um grito para dentro de mim, que arranca árvores pelas raízes, que explode veias em todos os corpos, que trespassa o mundo. Eu sou capaz de correr através desse grito, à sua velocidade, contra tudo o que se lança para deter-me, contra tudo o que se levanta no meu caminho, contra mim sempre. Porque a minha vontade me regenera, faz-me nascer, renascer. Porque a  minha força é imortal. "

(José Luís Peixoto)

terça-feira, março 04, 2014

Olarila

Ora aí está a verdade. Lá está ela marota, à coca, a espreitar pelo buraco da mentira e da omissão. Um olhito para cada racha coscuvilheira. Olhai como ela fita, com finta, para a realidade ofuscada e brincalhona. E tão atenta que ela está, a ver tudo passar e todos os palhaços que nela desfilam, todos contentes aqueles parvos iludidos, fazendo pouco de uma realidade aparente. Mas no meio destes parvos, há um que acorda e que por mero acaso sou eu. Acordei para a realidade nua e crua, sem capotes mentidos, nem truques de magia ou ilusões baratas. Apanhei-te verdade! E que bem nos damos nós. Não te julgo, não te martirizo mais, aceito-te com a dignidade que se deve aceitar qualquer verdade que, tal como tu, vivia oprimida e sem voz. A culpa não era tua, oh verdade, mas de quem te encobria. Anda cá, dá-me um abraço. Ui que bem que ele sabe. Quentinho e muito fofinho. Mas que rico abraço que me estás a dar, oh verdade!...

Revisited #1

  Não te vi mais, mas sinto-te todos os dias no alto-relevo da tatuagem que esculpiste em mim. Não há dor nem cor. Há-te. Tu hás em mim em f...